É O MEU RIO GRANDE DO SUL

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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

PONTO DE INTERROGAÇÃO

Modernos tempos




Indexação,desindexação,informática
Informação, designe,
Bites,mega complicação
Macroeconomia
Microsintonia
Palavras difíceis de entender
Fáceis para enganar.
Macroganância
Microcompreensão
Tempos modernos...
Globalização...
Global desilusão
Esqueceram de mim...
Esqueceram de macrodinamizar
A macroimportância
De amar...


Imagem e Poesia - ÁGUAS E LUZ

O grupo de trabalho GVC Mediador Leitor escolheu uma imagem do pintor Vladimir Kush para realizar a atividade proposta pelo curso

Vladimir Kush é um pintor russo, nascido em 65 em Moscou, que se identificou com o movimento do realismo metafórico. Ele experimentou vários estilos do impressionismo depois de ver a obra completa de Salvador Dalí nos anos 80. Segundo ele mesmo diz, as pinturas realistas mostram os limites de cada artista e ensinam ao visionário que cada um tem em si que as metáforas das imagens impossíveis exploram as camadas do sentimento.
ÁGUAS E LUZ

Águas que alimentam e engolem
Acariciam com suas ondas revoltosas
As rochas que olham o mar.
Velas destroçadas, rasgadas pelo vento,
não servem mais de alento ,
sugam o pensamento.
Os olhares buscam o acalanto
da luz sublime que surge
de mãos angelicais .
Surge...alivia tensões,
acomoda corações.
Os olhares se cruzam
sob o olhar que vem do infinito.
As emoções explodem,
entrelaçam-se mãos na direção da luz.
Que ora conduz, ora reluz
abrindo caminho
da salvação.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

CONTO _ A MESTIÇA E A CIGANA






Ainda podia sentir o sibilar do vento minuano, sinuoso e gelado vento do sul, que deixa até cusco rengo em pleno inverno, a soprar por entre as frestas do galpão onde relembrava as vezes que podia sair sem ser visto como aquele que matou por amor. Meados de julho de 1961. 
Vicente ainda sentia o gosto da risada que dera diante da dissimulada Amélia quando esta lhe dizia que uma cigana há teria surpreendido com uma conversa que até Deus dúvida, pois ela havia adivinhado o que ia pelo seu coração e pela sua vida.
_ Gargalhe, se esborrache rindo. Os homens costumam rir da desgraça alheia, principalmente os italianos, que trouxeram consigo de além mar a idéia de que por aqui suas rezas os protegeriam de tudo e de todos.
_ Duvida? Eu estava passando na estrada, perto da venda do Seu Alcides e fui abordada pela tal cigana que pegou a minha mão e começou a dizer coisas de minha vida. E foi tão real que até tive medo.
_ Se aquiete Amélia, acomode seu coração. Não se iluda com conversas de cigana, elas só querem pegar seu dinheiro.
Amélia entrou em  casa, pelos fundos, com receio de encontrar seus fantasmas pela sala da frente.
A chegada do companheiro de quartel de Vicente dera um rumo diferente a sua vida, que antes era de amores, agora era de inquietudes, despeito e falta de afeto. Ocupava-se todo dia com afazeres domésticos e ainda ia à roça com o marido, pois assim se estabelecia a vida no interior. Vida dura, de colheitas pequenas, de criar porco, de cuidar das vacas e galinhas, de não ter tempo para os prazeres da vida. Amélia, uma mulher cheia de vida, fogosa, de origem “mestiça”( pelo duro), como diriam os de por aqui. Seus olhos agora eram tristes e buscavam ao longe o alento de uma vida que não escolhera. Casou-se muito jovem e grávida. A obrigação é ter um marido. Mulher solteira e com filho por aqui dá muito falatório. Os gringos são safados.
O filho crescera e a vida se estabilizara com aquela mesmice enfadonha. Amélia quase estava se acostumando.
O dia da grande festa de Nossa Senhora da Saúde se aproximava. Era a festa mais importante do lugar. A única época do ano que se podiam comprar roupas e calçados novos. A festa de novembro. Com Amélia não foi diferente. Foi logo a venda e comprou um belo tecido estampado e ela mesma costurou seu vestido. O sapato não pode ser novo, mas assim mesmo Amélia estava ansiosa pela festa. Gostava de sair, de ver gente, de conversar, mas a vida na colônia não permitia isso. Os momentos de encontro se resumiam às missas que aconteciam de vez em quando, e aos terços do mês de maio.
13 de novembro – Missa, tiros de canhão, muitas pessoas de outros lugares, aglomerações ao redor da igreja, jogo de três sete, cinquilho, tômbola, e pesca no salão. As comadres reunidas a observar tudo e todos para depois ter assunto o resto do ano. Amélia acompanhava tudo com alegria nos olhos e no coração. Aguardava a reunião dançante que tinha por costume começar à tardinha. Não que fosse dançar. Gostava de ficar observando os casais mais jovens que trocavam olhares durante a dança. O movimento do corpo atiçava o desejo escondido de Amélia.  Ainda era jovem e a roça estava acomodando seus sonhos e vontades. Não tinha muitas comadres e amigas, pois sua origem mestiça gerava discriminação por parte das mulheres italianas, que se limitavam a ter filhos e servir o marido.
Quatro horas da tarde. Inicia o toque da gaita e Amélia sente correr em suas veias o calor e o desejo de poder se libertar.
Como de costume, senta próximo da pista de dança enquanto o filho brinca com a criançada ao redor da igreja e o marido continua na jogatina com seus companheiros.
No vai e vem de casais a bailar ao som de valsas e milongas, Amélia sente que estava sendo observada. Um homem diferente, novo no lugar, dançava com uma ou outra jovem. Tinha os cabelos negros, a pele levemente morena, olhos verdes, e uma elegância encantadora ao dançar. A reunião dançante seguia. Amélia, agora embriagada pelo olhar do estranho, deixa-se levar por sensações nunca antes experimentadas ou adormecidas. Só não desejava que ele viesse tirá-la para dançar. Preferia ficar com seus sonhos.
De repente, o homem se aproxima, pede gentilmente que Amélia dance. Relutante Amélia olha para os lados, procura pelo salão o marido que continua a beber e jogar. Olha novamente para os lados e percebe que as beatas e gringas a olhavam com olhos de serpente. Não quis arriscar sua reputação. Foi educada e disse: _ Agradeço, mas não posso dançar contigo. Sou casada. Meu marido, Vicente, está logo ali e poderá não gostar.
_ Vicente? A senhora é esposa do Vicente? Mas que coincidência! Vicente é meu grande amigo. Estive com ele até a pouco, relembrando os tempos em que servimos juntos no quartel. Estou por aqui visitando uns parentes e pretendo me instalar na vila com um pequeno negócio. Sou mecânico e vou tentar minha vida por estas bandas.
_ Assim mesmo não posso dançar. As comadres estão esperando o acontecimento para depois falarem de boca cheia.
_Seu nome é Amélia, não é? Vicente falou-me de você. Marcamos um jantar em vossa casa. Nos encontraremos ainda esta semana. Amélia estremeceu, poderá vê-lo outra vez.
O marido se aproximou e apresentou o amigo Reinaldo para a mulher e comunicou que o mesmo  estaria com eles no próximo final de semana e passaria uns dias em sua casa, até que instalasse a oficina na vila.
Isso parecia uma ilusão, a cigana estava certa. Algo novo estaria por acontecer. Um novo amor virá para alegrar a sua vida...isso martelava na cabeça de Amélia.
A festa foi se encaminhando para o final. Amélia pegou o filho e foi para casa. O marido, como sempre, foi mais tarde. Em casa, Amélia suspira fundo e sente uma pontada de agonia no coração, ao mesmo tempo vê-se envolvida num turbilhão de pensamentos excitantes que a deixaram sem dormir a noite toda.
No dia seguinte, volta a realidade triste, mas não esquece aquele olhar, o cheiro quente que saia da boca de Reinaldo. Trabalha com mais entusiasmo, faz as arrumações na casa para receber o hóspede que vinha de longe. As horas pareciam intermináveis. Os dias pareciam eternos. As noites não eram dormidas, eram sonhadas. Amélia entorpecia de sensações e emoções. Acordava com a boca seca e o corpo suado.
Reinaldo chega, Vicente o recebe com efusiva alegria e os dois sentam a tomar chimarrão e recordar os tempos de serviço militar. Amélia, que hoje vestira o vestido de festa, ocupava-se dos afazeres domésticos e sentia que o olhar de Reinaldo atingia seus ossos. E ela, não escondia sua fogosidade e atiçava o delírio de Reinaldo com movimentos insinuantes e despeitados. Vicente atinha-se a escutar o amigo e, saudoso, nem percebia o que acontecia ao seu redor. Jantaram, saborearam vinho da colônia, e continuaram as prosas até tarde.
Reinaldo acomodou-se na modesta casa, cercado de atenções pelo casal. Amélia procurava conter sua ansiedade e volúpia, ocupando-se das atividades costumeiras. Reinaldo montou sua oficina, alugando uma casa que há tempos se encontrava abandonada na vila. O tempo foi passando e os encontros com a família eram freqüentes. Reinaldo passava os finais de semana na casa de Amélia, que explodia a cada encontro.
É verão, época de safra, uma peça da carretinha agrícola enguiçou e Amélia, para ajudar o marido, muito solicita foi até a oficina para que a mesma fosse concertada. O encontro com Reinaldo, a sós, não podia ser diferente. Em meio a graxa das peças e com cheiro de óleo, que para Amélia parecia ser um perfume francês, os abraços e os beijos foram o inicio de uma relação perigosa e apaixonante.
Os encontros foram ficando mais freqüentes e Reinaldo foi se distanciando do amigo Vicente com a desculpa de estar abarrotado de trabalho.
Vicente, ocupado com o trabalho da roça, com o futuro do filho, quase não percebia a mudança de Amélia, mesmo porque, seu interesse por ela já havia ficado para traz.
Amélia ofuscava um brilho intenso nos olhos e passou a ir com mais freqüência às celebrações dominicais na igreja da vila. Trocava olhares insinuantes com Reinaldo e as comadres passaram a desconfiar das atitudes da antes tão calada Amélia.
Numa tarde, quando Amélia foi até o povoado fazer algumas compras na venda, encontrou novamente a cigana. Sentiu um arrepio na coluna e, impulsionada pelo desejo de saber o futuro, não se conteve e foi ter com ela. A cigana já foi adivinhando os pensamentos de Amélia e logo foi pegando sua mão. Na leitura da cigana um encontro deslumbrante estava por acontecer. O destino reservava para Amélia uma história de amor infinito.
A mulher, aflita e ao mesmo tempo feliz, foi ter com Reinaldo e a ele contou o dito da cigana. Reinaldo ria ao ver Amélia entusiasmada com as palavras da cigana.
_ Morena! Elas só querem o seu dinheiro, não se atenha no que ela disse. Mas, e o nosso futuro não  será infinito? _ perguntou Amélia.  
_Será infinito enquanto durar, disse Reinaldo. 
Amélia voltou para casa desapercebendo os olhares das comadres que já deitavam a falar sobre o comportamento da mestiça.
Reinaldo acomete-se de sobressaltos ao receber uma carta anônima, dizendo do seu relacionamento com Amélia, dando a entender que era o marido. Do mesmo modo, Vicente as recebe e passa a controlar as saídas de Amélia.
Reinaldo recebe um bilhete de Vicente, pedindo que o mesmo vá a sua casa para consertar uma máquina que havia enguiçado. Reinaldo pelas cartas que havia recebido, compara as letras e vê que não são iguais. Sente-se aliviado, mas encontra-se tão apaixonado que descarta qualquer possibilidade de desconfiança por parte do amigo. A vontade de ver Amélia o deixa destemido. Fecha as portas da oficina e, com seu carro, pega a estrada em direção a casa de Vicente. Passa pelo vilarejo, e no caminho, ao longe, avista a cigana que, despretensiosa, observa a chegada do carro. Reinaldo diminui a velocidade. Para. Percebe-se ansioso e desconfiado com o encontro casual. _Será que devo consultar a cigana? Pensou. É fruto de minha ansiedade por ver Amélia. Não acredito em previsões e visões. Sou de Deus, temente a Deus e nada vai me acontecer - completando seu pensamento. Mas a idéia de terem sido descobertos despertava medo e aflição, já que em lugarejos pequenos a conversa corre  mais que água em cachoeira. Pensou em voltar. Mas o oficio de mecânico o chamava para atender a precisão do amigo em hora de colheita. O olhar da cigana parecia uma ordem, espreitando Reinaldo para parar o carro e fazer a leitura de seu futuro. Nervoso e agitado encostam o carro a uma sombra e vai ao encontro da cigana que astuta e dissimulada vai se aproximando e já tilintando palavras que deixavam Reinaldo mais aflito ainda, especialmente por estar pressentido algo de estranho.
A cigana logo foi pegando sua mão e dizendo:
_ O senhor está indo ao encontro do seu grande amor. Está tomado de susto e preocupação. Não se aflija. O que é seu está guardado para todo o sempre. O amor é grande e vencerá todos os obstáculos. Ele de nada sabe, fique tranqüilo.
Reinaldo, aliviado, volta para o carro... Engatou a marcha e seguiu pela estrada esburacada e estreita rumo a casa do amigo. Observava atentamente e de forma deslumbrante a paisagem que ladeava a estrada. Roças, matas, morros e um ou outro riacho que despontava nas encostas e corria pelos pequenos vales. Olhou mais uma vez para o nascente , distante podia observar as escarpas que beiravam o rio Jacuí. O cheiro de terra molhada acentuava a impaciência de Reinaldo.
Dirigia nervoso, o pensamento não o deixava sossegar. Pensava no futuro e naquilo que já tinha vivido. Tudo tão maravilhoso e diferente. Jamais pensara em apaixonar-se pela mulher de seu amigo. E num lugarejo do interior, onde tudo é diferente. Parece que o lado selvagem e desmedido da cidade não chegou até aqui. Só chegou o amor e a  paixão desmedida pela mestiça do interior.
Em seguida, chegou a casa de Vicente, deixou o carro a certa distância. Não via nenhum movimento, nem os cachorros latiram com sua chegada. Foi se aproximando da casa, a porta entreaberta e tudo silenciavam. Hesitou por um instante, as cartas anônimas vieram-lhe a mente, o bilhete de Vicente ... será ? Não, pensou, devem estar no galpão preparando o material para a roça. Entrou devagar, a sala estava com as janelas fechadas. Ouviu um murmúrio e decidiu ir em frente. Chegou à cozinha e de soslaio foi pego pelo braço. Foi quando viu o corpo de Amélia estendido no chão, cabelos ensangüentados e sinais de luta. Vicente, com olhar odioso derruba Reinaldo sobre Amélia e defere três tiros que o deixam morto por sobre o corpo da mulher amada.
O vento continua a soprar, intrépido e indiferente a dor da solidão. Uma vingança, uma cigana, um filho, um amor...tudo frio.